quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Setor elétrico: capitalismo sem risco


Heitor Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal de Pernambuco

 
 
A reestruturação do setor elétrico brasileiro, irá completar 17 anos.
Teve inicio em 1995 com a lei no 8987 de 13 de fevereiro, que tratou
do regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos.
Um dos objetivos desta reforma, como diziam na época, era a criação de
um mercado competitivo, através de investimentos privados, que
resultaria no aumento da eficiência dos serviços elétricos e
diminuição do preço da energia para o consumidor. Promessa enganosa,
pois hoje pagamos uma das maiores tarifas de energia elétrica do mundo
e os serviços prestados, são de baixa qualidade com interrupções
freqüentes do fornecimento ao consumidor final.
 
Uma das regras vigentes  desta reestruturação diz respeito às
distribuidoras de energia elétrica que são obrigadas a ter 100% do
mercado coberto por contratos de longo prazo. Pelos dados da Agencia
Nacional de Energia Elétrica (Aneel), em 2011, concessionárias tiveram
sobra de eletricidade em suas carteiras. Até o nível de 103% de sobre
contratação os custos da sobra podem ser repassados para a conta de
luz do consumidor. Mesmo com as regras permitindo um ajuste de contas
entre as distribuidoras (quem esta subcontratada negocia com quem tem
sobra de energia), as sobras continuaram. Por exemplo nas empresas do
Grupo Neoenergia, a Coelba teve sobra de 3%, a Celpe de 1,8%, e a
Cosern, 3,6%. Já a distribuidora do Piauí teve uma sobra de 5,% e a de
Alagoas 4%. Existem casos até de sobre contratação de 40%.
 
Numa tentativa de abrandar o problema, liberando as distribuidoras da
energia excedente, foi anunciada pela Associação Brasileira de
Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), uma proposta que tem a
ver com o conhecido Grupo Bertin, que está enrolado com vários
projetos, inclusive das termelétricas Suape II e III (a mais suja do
mundo). O acordo envolveria sete usinas da empresa que estão com o
cronograma atrasado, ajudando assim o grupo a ganhar tempo. Como a
energia dessas unidades está contratada, o grupo Bertin teria de ir ao
mercado para comprar energia e honrar seus compromissos. Esta mesma
situação ocorreu no ano passado e teve repercussões negativas, e multa
aplicada pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, por uma
dívida contraída junto a Companhia Hidroelétrica do São Francisco
(Chesf) pela compra de energia. Neste caso a proposta da Abradee
consistiria na suspensão dos contratos do grupo, aliviando assim
aquelas distribuidoras que estão sobre contratadas e não precisam da
eletricidade neste momento.
 
O que fica evidente neste episodio é o erro nas projeções feitas pelas
distribuidoras de energia elétrica que ficaram acima da demanda
registrada em 2011, e que deve se repetir em 2012. Mesmo com a sobra
de energia as contas de luz poderão ficar mais caras para o
consumidor, pois podem ser repassadas para as tarifas.
 
Tudo que vemos hoje no setor elétrico é  uma deterioração por falta de
gestão, planejamento e de organização. Nos últimos 9 anos foi
verificada uma degradação contínua da qualidade dos serviços,
associado a preços crescentes da energia elétrica pago principalmente
pelo consumidor cativo (pequeno e médio consumidor industrial e
residencial e serviços públicos).
 
O espírito da privatização e do neoliberalismo dos anos de 1990 foi
mantido inteiramente, e em todos estes anos vimos ocorrer um processo
de captura do regulador pelo regulado. Os contratos de concessão no
Brasil têm pontos extremamente favoráveis ao empreendedor, ao
concessionário, pois transfere a população todos os riscos do negocio,
criando uma situação excepcional e de privilegio para as
concessionárias que deveriam prestar o serviço com continuidade,
qualidade e modicidade tarifária, por sua própria conta e risco.Daí a
necessidade de reverter esta situação com a modificação destes
contratos draconianos.
 
Infelizmente, mesmo com o racionamento e os apagões que precederam
2001, nada foi apreendido, pois em 2 anos do governo Lula ocorreram
dois apagões nacionais, e em um ano do governo Dilma mais 2 apagões
também nacionais.
 
A conseqüência desta desastrada política no setor elétrico penaliza
perversamente os consumidores que estão pagando uma conta abusiva para
altos lucros de poucos, em detrimentos do prejuízo de muitos.

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